sexta-feira, 11 de julho de 2014

Nietzsche e Budismo

Como um ocidental característico, algumas leituras filosóficas foram motivadas pela busca de um conteúdo substantivo sobre o mundo, e o que está por trás dele. Na minha adolescência tardia, o pensador com que mais me identifiquei, e que abracei as ideias, foi F.W. Nietzsche. Assim como ele, eu estava interessado pela busca da verdade, custe o que custar. E também como ele, tive uma "fase anal" (termo de Freud) bastante acentuada: ela se caracteriza pelo sujeito que imagina conceitos como impregnados de uma forte substância que os "eleva" para um status mais alto que o mundo sensível e material.

Nietzsche aponta que isso é um cancro ocidental que acompanha nossa mentalidade desde Platão. Sua superação da "fase anal" o levou a outro extremo, talvez: a "anti-fase anal". Mas isso, acredito, é apenas se o olharmos com as lentes anais que ele roga que sejam descartadas. As ideias, sugere, não devem ser levadas tão a sério, pois vão e voltam com uma facilidade proporcional à extensão da medida de tempo (resumo: milênios destroem ideias e criam novas).

A alternativa a esse cancro está no equilíbrio da fase genital: "cabeça fria e coração quente", diz Zaratustra. É medir com precisão o que é realmente a linguagem e os sentimentos. Estados de espírito transitórios. Os elementos que estão mais "grudados", como Deus para um cristão, são fruto do condicionamento da cultura ocidental. O problema, veja, não está na ideia de Deus em si, mas na atitude que o rebanho toma em relação a ela. Ele a deixa dominá-lo.

As ideias são apenas nuvens, diz a doutrina budista. Vem e passam. Não são mais do que a "Maya" - o véu ilusório que nos esconde a essência das coisas (essência da falta, do vazio, do nihil). A ética ideal (desculpe o trocadilho) está no equilíbrio entre prática (mundo material sensível, yin) e ideia (linguagem, yang), para nenhum dos dois ser mais forte que o outro.

Tanto Nietzsche quanto o Budismo advogam esse equilíbrio. Nietzsche criticou o desequilíbrio ocidental em favor da Maya: o mundo real de Platão é o das ideias, e no ocidente isso teve efeito desastroso.
Tenho a impressão que no Oriente as coisas são mais equilibradas, mas isso tem um efeito também "negativo" (e.g. a despreocupação ecológica).

Há uma interessante discussão em inglês:
http://www.orientalia.org/archive/publications/english/buddhism-and-nietzsche/


Eu discordo da interpretação desse texto: para mim o Übermensch e Buda (os que atingem o Nirvana) são iguais. O que os une é relação tomada frente às pulsões. O que os diferencia, aparentemente, são os tipos de pulsão que ocorrem (Buda está para o monge pacato quanto o Übermensch está para o Rambo). Prefiro abstrair essas diferenças e resumir os dois no aforisma: "Cabeça fria e coração quente." E atinjamos a fase genital.


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